sexta-feira, 7 de agosto de 2015

Aos talentosos, e aos nem tanto!

A Parábola dos Talentos está descrita em Mateus 25 e em Lucas 19. Dá para mensurar a sua importância no inconsciente coletivo português  do passado apenas pela palavra talento, que significa uma medida de ouro, e na língua portuguesa, a partir dessa parábola, passou a designar habilidades especiais: talentos.

Minhas lembranças das leituras desse texto não eram boas. Um certo Senhor, nobre, sai para negociar a posse de seu reino, e deixar talentos com seus servos (para testa-los), pedindo que eles os negociem. Muito tempo depois, quando volta, vê o que servos conseguiram aquinhoar, o que tinha 5 conseguiu mais 5, o que tinha 2, mais dois, e o que recebera 1, veio com desculpas: "sei como o Senhor é, pessoa muito dura, toma o que não é seu, colhe onde não planta... então tive medo e enterrei o meu talento". O Senhor é drástico: "Mal servo, pelas suas palavra o julgarei. Se eu sou assim como você diz, deveria pelo menos deixar meu dinheiro com os banqueiros, para que eu recebesse os juros. Peguem o seu talento e dêem-no ao que tem 10". Os empregados reclamaram: "Senhor, ele já tem 10 talentos!" E o Senhor responde:"Ao que tem mais se lhe dará, e ao que não tem, até o que tem lhe será tirado".


Enfim, eu morria de medo da história, até por me ver um pouco como o medroso, e porque eu não fazia nada na igreja... Aos que não tem a cultura evangélica ou católica, fiquem sabendo, esse texto é usado para incentivar os fies a participarem ativamente dos trabalhos das igrejas, mantendo seus talentos em ação.

Na verdade, o problema de entendimento dessa parábola está justamente na teologia que a maioria de nós tem impregnada, na leitura dos textos de Jesus.

O contexto da história

Jesus conta esta parábola as vésperas de morrer na cruz, como preparação para seus discípulos, que imaginavam que o poderoso reino do messias estaria prestes a acontecer. Essa parábola é contada junto de outras, cada uma com um enfoque diferente em relação aos problemas que a demora da volta de Jesus traria ao coração dos discípulos de Jesus.

A parábola das virgens, onde 10 damas de companhia caem de sono e tédio pela demora do noivo é um retrato do que o desanimo, marasmo, continuo escurecimento e sono de quase todos traz a alma do cristão. É preciso, mas que qualquer coisa, manter o "pote de azeite do Ser" sempre cheio.

A parábola dos empregados que se valem da situação da demora do Senhor em voltar, e aproveitam para escravizar seus colegas, é outra palavra de alerta a maldade do coração humano ante a demora de Jesus.

Enfim, temos a parábola dos talentos: é um chamado contra a covardia, e contra a má vontade perante a vida.

Ainda, em Lucas 19, há a alusão, no início da parábola, a súditos descontentes que enviam uma caravana para reivindicar outro Rei. Isso realmente aconteceu, quando Arquelau, filho de Herodes, o Grande, reivindicou as terras e as ganhou (metade delas), enquanto a elite local do país enviou uma caravana para tentar demover a César. 

Da mesma forma, no final do texto de Lucas, há a sentença de morte para aqueles súditos. Ora, essa foi uma fala escatológica de Jesus. Esses súditos, a elite judaica , a mesma classe que havia enviado uma comissão a César contra Arquelau, eles foram os responsáveis pelo espírito belicoso que crucificou Jesus, e mais tarde, jogou os judeus numa guerra contra Roma, com a destruição de Jerusalém, do Templo, e deportação de milhares e milhares de Judeus para servirem de escravos em todo o Império.


O que são os Talentos?

Essa é a chave de parábola! Os talentos são muito mais que sua habilidade, ou dom, que possa ser usada no modus operandi da igreja. Toda sua potencialidade de produção do bem, toda sua capacidade de ajudar nas oportunidades que surjam ao longo da vida, são talentos e chances de utilização dos talentos.

Ora, não é a por acaso que Jesus conta, logo depois desta parábola (em Mateus), sobre o Julgamento, em que seremos separados, como bodes e ovelhas, porque enxergamos( e ajudamos) ou não nos pequeninos que nos rodeiam, a Jesus.


E esse Senhor, que colhe onde não planta? 

Essa é a imagem que o servo faz de Deus... colhe onde não plantaste... Em outras palavras, pega o que não é seu! E o Senhor o julga pelas suas palavras. É exatamente assim que está escrito: "pelas tuas palavras o julgarei". E continua: se você realmente acredita que sou deste jeito, porque você não fez o mínimo, deixar o dinheiro rendendo juros no banco?

O servo mau carrega um perfil psicológico muito comum: o de pessoas que se viciam em criticar os outros, o que eles fazem ou o que eles dizem. Na verdade, este é um espírito terrível, esse olhar vasculhador que procura defeitos para então lançar a sentença final: ele é preguiçoso, ele é malandro, ela é safada, ela não se comporta como deveria, ela é prepotente, ele é rancoroso, etc. O resultado disso é, em muitos casos, o de uma pessoa paralisada, que não faz nada, porque não suporta que venham a medi-la com a mesma régua que ela usa para medir os outros.

Esse servo mau, carrega ainda uma má vontade, uma espécie de preguiça: para que correr riscos por esse Deus? Outra psicologia típica: eu, me esforçar por esse chefe, por essa empresa? Tenho certeza que me chutarão quando tiverem chance! Ou: Eu, dar duro para enriquecer mais ainda esse chefe? Ah, se ele é tão safo assim, que enriqueça sem minha contribuidão!

Quando Jesus afirma que "ao que tem, mais se lhe acrescentará, e ao que não tem, até o que tem lhe será tirado", ele não está fazendo nada além de uma observação de uma lei natural das relações humanas.

Ou não é assim? Quem você procura quando chega na repartição pública? Aquela pessoa que te tende do boa vontade e tenta resolver seu problema ou aquele reclamão que morre de medo de tomar qualquer atitude para não ser repreendido depois?

A qual colega de trabalho você recorre, quando precisa de ajuda no seu projeto?

A qual funcionário você premia? O que trabalha de boa vontade ou o que vive se escondendo do trabalho?

Quem você indicará? a faxineira competente, que fazia tudo o que era pedido, ou aquela que vivia se escondendo do serviço, levando horas para varrer a casa?

O mesmo vale para as capacidades produtivas: elas crescem a medida que você as põe em prática, e definham quando você as mantem enterradas dentro de você.

A quem tem ser-lhe-á acrescentado, e ao que não tem, até o que tem ser-lhe-á tirado!

De fato essa é mais um parábola de apelo para que voltemo-nos à generosidade. Conquanto pensemos que entendemos a Graça de Deus, muitas camadas interiores só serão atravessadas pelo Espírito de Jesus quando nos dermos a chance de praticar o bem ao próximo!

Ser generoso, colocar a disposição do próximo seu dom, sua chance de produzir o bem, até mesmo seu dinheiro - se você, de fato, crê que morremos par esta vida, e ressuscitamos com Ele, novo homem! - ser generoso implica num ato de fé. 

Coloque seu amor para fora! Acredite! Ame! Faça o bem.

Leo
Macaé, 7/8/15

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